Caros Leitores;
Com mais de 150 anos de existência, o símbolo mais forte da
química é marcado por embates entre cientistas e por questionamentos quanto ao
futuro dos elementos
POR NATHALIA FABRO | EDIÇÃO GIULIANA
DE TOLEDO | ILUSTRAÇÕES FERNANDO MOLINA | DESIGN MARCOS DE LIMA
SOPA DE LETRAS Conheça a aplicação de cada elemento e a
forma de organização da tabela (Foto: Ilustração: Fernando Molina)
No dia 17 de fevereiro
de 1869, o russo Dimitri Ivanovich Mendeleiev (1834-1907)
adormeceu sobre a sua mesa. Na manhã seguinte, traçou linhas e colunas que
mudaram a história da química. “Vi em
um sonho uma
tabela em que todos os elementos se encaixavam como requerido. Ao despertar,
escrevi-a imediatamente numa folha de papel”, declarou tempos depois. Nascia a tabela periódica.
No 150º
aniversário desse acontecimento, a Assembleia Geral da Organização das Nações
Unidas (ONU) e da Unesco instituiram 2019 como o ano internacional da tabela
periódica. Enquanto as contribuições do sistema para a ciência são
indiscutíveis, a celebração levanta questionamentos políticos sobre sua origem
e como o uso dos elementos afeta o meio ambiente.
Antes dela, cientistas trabalhavam sem que houvesse um agrupamento
unificado das substâncias. Isso tornava o entendimento das ligações químicas,
por exemplo, menos democrático e dificultava até o descobrimento de novos
componentes. Um cenário caótico.
“À medida que os químicos foram sofisticando as teorias sobre
propriedades elétricas, começaram a melhorar os métodos de quantificar os
dados. Até que chegou o momento em que havia mais de 50 elementos conhecidos —
e era preciso organizá-los”, conta Guilherme Marson, professor do Instituto de
Química da Universidade de São Paulo (USP). “A tabela periódica é o instrumento
mais poderoso para trafegar das coisas materiais para o mundo das ideias
químicas”.
Quebra-cabeça
Evolução
Evolução
A inovação de Mendeleiev foi a proposição de
uma organização lógica com base na massa atômica — soma de prótons e nêutrons —
dos 63 elementos conhecidos naquela época. O mais surpreendente, porém, é que
ele estimou valores de massa e propriedades de elementos que ainda não haviam
sido descobertos, deixando espaços em brancos para serem preenchidos.
Em O Sonho
de Mendeleiev (Zahar, 268 páginas), Paul Strathern conta que o russo
dispôs na mesa cartões com dados dos elementos para entender como estavam
relacionados. Assim, acabou descobrindo a Lei Periódica, cujo conceito é o de
que substâncias com características químicas semelhantes ocorrem em intervalos
regulares.
A primeira tabela
de Mendeleiev foi publicada pela Sociedade Russa de Química em março de 1869. O
sistema, no entanto, não foi aceito imediatamente por outros cientistas.
Somente duas décadas depois, elementos “ausentes” foram descobertos,
comprovando a teoria. É caso do gálio (1875), escândio (1879) e germânio
(1886).
Guerra fria
Contudo, a
organização dos elementos não foi um feito só de Mendeleiev. Em setembro de
1860, o italiano Stanislao Cannizzaro (1826-1910) apresentara uma pesquisa
sobre o peso atômico durante um congresso na Alemanha. Mendeleiev estava
presente e aproveitou o conceito para criar sua tabela anos depois. O trabalho
de Canizzaro também influenciou o químico alemão Julius Lothar Meyer (1830-1895).
Em 1870, ele publicou um artigo com uma tabela semelhante à de Mendeleiev.
Registros apontam, porém, que Meyer havia iniciado o agrupamento dos elementos
antes do russo.
Donald Kelling, químico da Universidade de Richmond (EUA), relata que a
proximidade das publicações gerou um conflito. Em 1892, a Real Sociedade de
Londres premiou os dois com a Medalha Davy, que reconhece as descobertas mais
recentes na química. “Suspeito que a Sociedade tinha, de algum modo, esperança
de acalmar a disputa, mas não vi nenhuma confirmação oficial de tal suspeita”,
ele comenta. “Mendeleiev e Meyer são mencionados em livros didáticos. Alguns se
referem apenas a Mendeleiev. Citar um protagonista é mais simples, e mesmo em
áreas tão distintas, como esportes e política, as pessoas gostam de ter apenas
um alguém para elogiar ou culpar”.
Henrique Eisi Toma, professor do Instituto de Química da USP, considera
que Meyer publicou uma versão “quimicamente melhor”, mas não teve uma
comunicação científica eficiente. “Era mais bonita, e ele explicou a semelhança
dos elementos e explorou o conceito de periodicidade e valência [capacidade de
combinação dos átomos]. Mas não ganhou fama”.
Desde a primeira publicação, a tabela passou
por várias mudanças [leia a linha do tempo]. Mendeleiev havia separado os
elementos pela massa atômica, mas agora a ordem é pelo número atômico (número
de prótons no núcleo). A versão inicial continha 63 elementos; atualmente, são
118 — entre naturais, aqueles encontrados na natureza, e sintéticos, que são
produzidos artificialmente. A alteração mais recente ocorreu em 2015, com a
adição de nihônio (Nh), moscóvio (Mc), tennessino (Ts) e oganessono (Og),
elementos sintéticos que têm, respectivamente, os números atômicos 113, 115,
117 e 118.
Entretanto, enquanto alguns elementos são
adicionados, outros podem desaparecer. Segundo a Sociedade Europeia de Química
(EuChemS, na sigla em inglês), 45 elementos naturais correm risco de extinção
[veja gráfico completo na próxima página]. Para Toma, da USP, as comemorações
dos 150 anos da tabela periódica são uma oportunidade de destacar e enfrentar
esse problema. “É um recado para o mundo acordar e pensar nos elementos como um
bem da natureza”, reflete.
“Os elementos não são eternos.” Os mais
comprometidos são os usados na fabricação de eletrônicos. David Cole-Hamilton,
vice-presidente da EuChemS, chegou a declarar publicamente que o suprimento de
índio, metal prateado usado para criar telas sensíveis ao toque, como as de
celulares e tablets, está “extremamente pouco distribuído” no mundo. Suas
principais ameaças são o consumo e o descarte excessivos de equipamentos.
PERTO DO FIM? Versão da tabela mostra elementos naturais por
abundância e escassez (Foto: Ilustração: Fernando Molina)
Outro que causa preocupação é o hélio. O segundo elemento mais presente
no Universo pode ter apenas algumas décadas restantes por causa — acredite —
das bexigas que enchemos. Enquanto o gás usado em equipamentos de ressonância
magnética ou cilindros para mergulhadores pode ser reciclado, a substância que
sai dos balões vai diretamente para a atmosfera e pode se perder no espaço.
“A lógica, na verdade, não é que o elemento em extinção está
desaparecendo. O problema é consumir e não reciclar, pois o descarte incorreto
espalha o elemento, que ficará tão diluído na Terra que será praticamente
inviável ou caríssimo concentrá-lo novamente”, explica Marson. Para minimizar
os impactos há vários caminhos: redução do consumo, produção de aparelhos mais
duráveis ou com elementos menos raros e investimento na cultura de
reaproveitamento.
Menos é mais
Os pesquisadores da USP ouvidos pela reportagem, contudo, são
pessimistas quanto a isso. É que quanto maior o número atômico, mais rápido o
elemento ocorre, é quase imperceptível. E para ser identificado é preciso ser,
pelo menos, estável. “Essa previsão é de elementos muito pesados, que vivem
milionésimos de segundos. Você nem termina de falar e já acabaram. Eu diria que
a chance de descobrir novos elementos é zero”, opina Toma.
Já Guilherme Marson poderá que “à medida que
técnicas de detecção ficam mais sofisticadas, pode acontecer”. “Mas estamos
deixando a ideia de descobrir novos elementos da tabela. Agora é hora de
planejar novas coisas com os já existentes.” Uma possibilidade, segundo ele,
está na nanotecnologia. “Desenvolver dispositivos com os mesmos elementos em
quantidades pequenas para conseguir efeitos melhores”, exemplifica. “Elementos
na escala nano são completamente diferentes, mais reativos, cheios de
propriedades”, concorda Toma. “Na minha visão, o futuro é procurar
nanoelementos”.
Independentemente de quais sejam as mudanças, o
que se prevê é que somas ou subtrações de elementos vão acabar encontrando
encaixe na tabela — ainda que sejam realidades com que Mendeleiev nem poderia
sonhar.
Tabela
periódica mais antiga do mundo é encontrada na Escócia
Fonte: Revista Galileu / 02-04-2020
Obrigado pela sua visita e volte sempre!
HélioR.M.Cabral (Economista, Escritor e Divulgador de conteúdos da Astronomia, Astrofísica,
Astrobiologia e Climatologia).
Membro da Society for Science and the Public
(SSP) e assinante de conteúdos científicos da NASA (National Aeronautics and
Space Administration) e ESA (European Space Agency).
Participa do
projeto S`Cool Ground Observation (Observações de Nuvens) que é integrado ao
Projeto CERES (Clouds and Earth´s Radiant Energy System) administrado pela
NASA.A partir de 2019, tornou-se membro
da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), como astrônomo amador.
Participa também do projeto The Globe Program / NASA
Globe Cloud, um Programa de Ciência e Educação Worldwide, que também tem o
objetivo de monitorar o Clima em toda a Terra. Este projeto é patrocinado pela
NASA e National Science Fundation (NSF), e apoiado pela National Oceanic and Atmospheric
Administration (NOAA) e U.S Department of State.
e-mail: heliocabral@coseno.com.br
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